Os rumores são sempre mais insistentes e, recentemente, até
o ex diretor do Gambero Rosso falou a respeito: Robert Parker estaria passando a Wine
Advocate para o Antonio Galloni, atual responsável da publicação para
vinhos da Itália, Borgonha, Champagne e Califórnia.
O Galloni, ex investment banker de sucesso, estaria para
ganhar o comando e (talvez adquirir a propriedade) da The Wine Advocate e parece a mais lógicas das conclusões da ascensão
do Robert Parker ao teto do mundo ao seu atual declínio.
Já vimos aqui e aqui a
história do advogado de Baltimore que se tornou o mais influente crítico de
vinho do mundo. A aposta que ele ganhou foi elogiar exageradamente a safra de
1982 em Bordeaux, que outros críticos tinham desprezado por ser muito
concentrada e super-madura. Nascia assim o gosto internacional, ou na
realidade, o gosto do Parker. Daí e escalada para o topo do mundo.
A primeira revolução da The Wine Advocate aconteceu em 2006
quando o Parker, que até então havia enfatizado a importância de degustar todos
os vinhos pessoalmente, contratou uns colaboradores: o ítalo-americano Antonio
Galloni trataria da Itália; o David Schildknecht (dito “The Man-Machine” pois
nas degustações ao invés de escrever, ele fala em um gravador) argumentaria
sobre vinhos de Alemanha, Áustria e algumas regiões da França como Borgonha,
Loire e Champagne; o controverso Jay Miller teria coberto Oregon, Washington,
Austrália, Nova Zelândia, Espanha e América do Sul. Do escândalo que o envolveu
falamos aqui e
aqui.
Em 2010 Austrália e Nova Zelândia passaram para a Lisa
Perrotti-Brown, residente em Cingapura: esta mexida foi ditada não somente
pelas usuais acusações de conflito de interesse do Miller, mas também pela
exigência de influenciar mais fortemente o mercado Asiático.
Sucessivamente outros novos colaboradores ficaram com vinhos
de mercados menores e emergentes como África do Sul, Israel, Grécia, Líbano e
Europa do Leste.
O Império do Robert Parker se reduzia então a Bordeaux,
Califórnia e Rhone, onde impôs, com notas estratosféricas vinhos super-alcoólicos
e super-concentrados.
A bomba chega em fevereiro de 2011: Califórnia e
Borgonha passam sob a responsabilidade do Antonio Galloni, que no entanto já tinha
recebido Champagne pouco antes.
O fim de uma era e o começo de uma nova.
Acontece que o Galloni tem gostos bastante diferentes do
Parker (vamos adicionar um “graças a Deus”?): não é um fanático da
super-concentração, preferindo vinhos mais equilibrados e de estilo mais tradicional, sobretudo cuidando finalmente do
fator terroir, considerado de maneira
infeliz pelo Parker uma invenção de marketing dos europeus.
Quem analisou as notas do Galloni dos vinhos californianos -
sim, há pessoas que têm todo esse tempo livre - tem notado que as notas
de 97 pra cima são a metade respeito a quando o Parker tratava da região; mas
a média subiu de 91 para 92. Ou seja, o ítalo-americano é mais generoso na base e menos no topo.
A notícia não está ainda confirmada, mas parece somente uma questão de tempo. De qualquer forma o Galloni é o crítico da Wine Advocate que
mais interpreta a evolução do gosto do mercado que está voltando atrás, cansado
de vinhos opulentos e idênticos e à procura de vinhos de terroir; onde mais que o enólogo (quanto o Michel Rolland deve ao
Parker?) conta o respeito do território.
Que os produtores tomem nota, sobretudo aqueles que acham
que a repetição de uma mesma receita sempre traz resultados: o mercado muda,
meus caros.
E faz todo o sentido que uma publicação tão influente como a
Wine Advocate respeite a vontade do consumidor.
Mario,
ResponderExcluirAcompanho seu blog há algum tempo e tenho sempre prazer em ler seus posts.
Quanto ao Parker, entretanto, me parece que suas críticas estão mais ligadas ao estilo de vinhos que ele valoriza do que as fraudes/nebulosidades de algo tão subjetivo quanto a avaliação de um vinho.
Concordo plenamente que as variações de preços sofridas por vinhos bem avaliados pelo RP/WA criam abismos inconcebíveis no mercado - e sou adepto da linha que acredita que vinho se conhece é bebendo - mas será que se um outro avaliador (Galloni, por exemplo), que valoriza mais os vinhos "clássicos" - os quais claramente fazem muito mais seu estilo - tivesse tamanho reconhecimento e impacto no mercado seus deslizes e gafes seriam tão frisados neste espaço?
Entendo e concordo que blog, assim como gosto, são coisas particulares, e não estou querendo questionar a razão ou mérito das críticas - até porque seu conhecimento a respeito de vinhos e do mundo que o cerca é muito maior que o meu. Mas, como leitor regular de seu blog, gostaria de registrar que me atraem muito mais todos os outros posts do que os que insistem em escrutinar continuamente RP e suas polêmicas.
Grande abraço e, mais uma vez, parabéns pelo espaço.
José Filipe
Caro José Filipe,
ExcluirVamos por pontos:
- Primeiramente muito obrigado pela sua leitura, pelos elogios e por participar ativamente do blog com seus comentários.
- No passado já critiquei bastante o Parker, mas este talvez seja o post menos polémico que já escrevi a respeito: aqui simplesmente contei os fatos e um pouco da história...
- De qualquer forma as minhas críticas são (como vc justamente notou) relativas ao estilo que ele valoriza sim, mas também a injustificáveis altas notas...injustificáveis pelo menos até o estouro dos escândalos, que começou a explicar melhor estas avaliações suspeitas...
- Quanto ao Galloni, não sei se vai ter a mesma influencia do Parker, na verdade duvido muito, mas de qualquer forma é um sinal de mudança dos tempos e dos gostos, e acredito que com o passar dos anos estes vinhos que estiveram na moda até agora serão ultrapassados.
- Sobre o voltar ao mesmo assunto, a sua queixa fica registrada (aliás, agradeço pela informação!), de qualquer forma, há de convir que estamos falando da pessoa mais influente no mundo do vinho dos últimos 30 anos e tem gente que só quer saber dele...Se ele realmente deixar, vai ser um marco na história do vinho. Por isso o MondoVinho não pode ficar por fora e por isso não posso deixar de comentar.
Obrigado novamente!
Grande abraço
Mario, tenho de reconhecer a parkerizada que assola boa parte do mundo (acredito que muito mais no Novo Mundo) nos últimos tempos. É um tal de 15% de álcool com cheiro de defumado e baunilha que não tem muitos limites. Na esteira dele vem o principal representante enólogo, o Michel Rolland.
ResponderExcluirTambém não curto muito essa massificação em direção a um gosto pessoal, mas quando vejo o que o Rolland fez por aqui, começo pensar que o trabalho dele, e de certa forma o gosto pessoal do Parker, contribuiu para que tenhamos hoje um vinho nacional de qualidade razoável.
Talvez para países como o Brasil, onde o solo e o clima não contribuam muito para termos ícones, seja desejável esse tipo de profissional que tenha expertise em fazer um vinho razoável apesar das condições não tão favoráveis.
É claro que me refiro aos vinhos tintos e brancos, os espumantes temos produtos muito bons!
Abs
Marcelo,
ExcluirInteressante visão a sua. Talvez esta massificação tenha elevado o nível médio de qualidade dos vinhos de baixa gama no mundo inteiro, mas, para falar em Brasil, pessoalmente acho que os melhores vinhos são justamente os que fogem desta regra. Paradoxalmente, os produtores nacionais que querem fazer vinhos internacionais (para não dizer “parkerizados”) ficam devendo em termos de qualidade e preço para os demais colegas dos outros Países. Já as vinícolas que produzem vinhos respeitando o terroir, de forma artesanal, sem forçar a natureza nem querendo fazer alquimia nas adegas, são pra mim aquelas que conseguem o melhor resultado: vinhos com tipicidade, personalidade, e com vocação para acompanhar a comida. E, sobretudo, custo razoável. Tudo isso sem pagar o cachê milionário de Rolland...
Obviamente esta é a minha opinião pessoal e, é claro, você tem todo o direito de não concordar. No entanto eu agradeço por ter compartilhado a sua opinião conosco.
Grande abraço!
Mário, tenho a impressão que o preço praticado pelas vinícolas nacionais tem uma relação forte não com o preço em si, mas com a imagem que elas querem que seus vinhos tenham. Vou dar dois exemplos:
Excluir-Quando o dólar deu uma caída tremenda lá pra 2009 ou 2010 os vinho começaram sul-americanos começaram a ficar um pouco mais em conta, uma grande vinícola simplesmente baixou os preços, para assim acompanhar a imagem que queriam que seus vinhos tivessem. Nem acima, nem abaixo.
-Uma outra vinícola que não parkeriza seus vinho, produz alguns exemplarem muito interessantes que eu e minha esposa adoramos, resolveu fazer um vinho ícone: Um Nebiolo a R$275,00 por garrafa. Respeito o trabalho que essa família faz, respeito também o fato de que eles tem o direito de colocar o preço que quiserem o produto deles e compra a garrafa quem quer, mas R$ 275,00 num Nebiolo feito no Brasil? Comprei uma garrafa, era um vinho bom, mas não valia a metade da pedida.
Mudando de assunto e ainda falando do assunto: Uns dois anos atrás conversei com um micro (não posso falar que aquele era um pequeno) produtor de vinhos lá do sul. Segundo ele, conforme as grandes vão fazendo vinhos com técnicas modernas (entenda-se como técnicas do Rolland), os pequenos vão observando o que deu certo e errado e dessa forma vão usando na sua produção o que deu certo. Provei um vinho branco dele que achei excepcional. é nesse tipo de caso que acho que indiretamente existe um dedo do Rolland.
Abs
Marcelo
Caro Marcelo,
ExcluirA questão dos preços no Brasil é algo que ressalta mais ainda a juventude e a limitada experiência do nosso mercado (seja com os importados e talvez mais ainda com os nacionais).
De qualquer forma existem sim produtores nacionais não adeptos à “parkerização” e capazes de fazer bons vinhos de terroir e com bons preços.
Como todas as coisas, é tudo relativo, depende realmente do o que o produtor quer fazer, qual resultado quer alcançar e que tipo de público-alvo conquistar.
Obrigado mais uma vez por participar ativamente do MondoVinho.
Abraço!