Ok, vamos tentar descrever o indescritível: Soldera Sagiovese Case Basse 2008.
A história do Gianfranco Soldera é bastante notória.
Personagem difícil de lidar, com ideias talvez um pouco radicais, mas
certamente viticultor apaixonado e iluminado. Produtor do Brunello di Montalcino mais celebrado dos últimos tempos, hoje não
pode mais rotular seus vinhos sob esta famosa denominação.
A tentativa de vingança
que seu ex-funcionário quis realizar contra o ex-patrão “tirano” invadindo a
vinícola durante uma noite em dezembro de 2012 e abrindo todas as torneiras de
barricas e tonéis onde maturavam 62mil litros de vinho, e consequentemente jogando no ralo 6 safras daquele que
era considerado o melhor Brunello di Montalcino, na verdade se tornou um grande
favor para a vítima: seus vinhos ficaram
ainda mais requeridos e os preços triplicaram.
Nesta ocasião, apesar das críticas ferozes que o Soldera tinha feito anteriormente contra
vários produtores de Brunello que estavam usando outras castas não permitidas
pela denominação, o Consórcio ofereceu para ele uma quantidade de uvas ou vinho
como símbolo de solidariedade para
que ele não ficasse fora do mercado. Mas a oferta irritou mais ainda o
temperamental produtor: para ele o Consórcio estava propondo uma tentativa de “fraude” aos seus consumidores,
engarrafando vinho produzido por outros. Na verdade os outros produtores
queriam ajudá-lo no momento de dificuldade sugerindo que rotulasse a safra
recebida em doação com algo tipo “A garrafa da solidariedade” e se quisesse
poderia doar por sua vez os proventos para caridade. O nosso Soldera não apenas
recusou, mais ainda atacou os colegas, considerando a oferta como inaceitável e ofensiva.
Enfim, errado o certo, o fim da história é que Soldera não
faz parte mais do Consórcio do Brunello di Montalcino. E, como previsível, seus
rótulos se tornaram ainda mais mitológicos.
Mas vamos ao vinho.
Este Sangiovese IGT é de fato um Brunello Riserva, mas pelos motivos acima não pode ser rotulado com a
indicação da DOCG. O vinho é resultado de cultivo tradicional, vindo de
vinhedos orgânicos conduzidos sem nenhum tipo de química. Dupla poda (inverno e
verão), tratamentos naturais de doenças e colheita manual são mandatórios para
ele, assim como o utilizo de leveduras espontâneas. Maturado por 63
meses em grandes tonéis da Eslavônia, segue afinando por mais 2 anos em garrafa em adega
subterrânea (14 metros sob o solo) e temperatura natural constante de 13º graus, com umidade de 85%.
Na taça o vinho é um espetáculo. Eu diria um Brunello com a alma da Borgonha. Cor clarinha, um rubi de
pouca intensidade, translúcido e límpido, apesar de não ser filtrado. O nariz
mostra ainda certa timidez devida à sua juventude, mas o bouquet entrega perfumes de campo, pétalas de
rosas, violetas, canela, talco, esmalte, tabaco. Na boca é algo sublime: leveza
etérea e complexidade de sobra. A fruta delicadamente doce, a excelente acidez que
forma sua espinha dorsal, a madeira imperceptível e os taninos finíssimos e
aveludados fazem deste caldo uma
verdadeira obra prima.
Como já escrevi em rede social: falta o Vivino disponibilizar a 6ª estrela para que eu possa dar uma
avaliação mais justa. Pra mim, o vinho perfeito.