Muitas das coisas que se falam sobre vinho são subjetivas e contestáveis,
especialmente no que se diz a respeito do gosto: este é totalmente pessoal e
não há críticos ou livros que vão te convencer do contrário. Muitas teorias
bonitas e aparentemente perfeitas, mas afinal das contas o paladar reina sempre soberano.
Mesmo assim há algumas certezas universalmente reconhecidas e
tecnicamente irrefutáveis. Como por exemplo, o "teorema" sobre a perlage dos espumantes. Qualquer
cursinho básico sobre vinho vai te ensinar que quanto menor a borbulha, tanto mais o espumante será elegante e fino. Demoramos décadas para chegar a este “axioma”
e tínhamos certeza que ninguém teria como afirmar o contrário.
Outro postulado anexo (mas este é mais recente) é que flute não seria a taça mais apropriada
para espumante pois seria mais indicada uma taça com um pequeno bojo, tipo uma
tulipa (como da foto ao lado) ou até mesmo uma taça para brancos tranquilos.
Aí logo no final do ano, quando você já comprou os Champagnes com
a borbulha mais fina do mercado e requintadas tulipas em cristal alemão, chega
o The Guardian para estragar suas festas e demolir uma das poucas certezas que você
tinha sobre vinho. O jornal britânico revela que Champagne com borbulhas mais grossas é melhor...
De acordo com um estudo capitaneado por Gérard Liger-Belair,
cientista da Universidade de Reims, a dimensão maior da bolhinha favoreceria
a expressão dos elementos aromáticos.
Como se isto já não for suficiente, a matéria sugere também que a
melhor taça para apreciar Champagne seria justamente a repudiada flute. Isto
pelo mesmo motivo, ou seja para o desenvolvimento de aromas na presença de borbulhas
grossas.
Sem querer contestar os “gurus” do The Guardian, mas já
contestando, podemos ressaltar pelo uns pontos. Primeiro, o artigo, partindo do pressuposto (errado) que mais aroma equivale a mais sabor,
automaticamente chega à conclusão (errônea) que borbulha grossa se traduz em
vinho de melhor sabor. Em segundo lugar, se realmente temos que procurar mais
expressão aromática, então seguindo o raciocínio esta se encontra mais
facilmente numa taça mais ampla, o não?
Outra coisa, se mesmo quisermos entrar em terrenos perigosos: os técnicos me ensinam que na verdade a dimensão da
borbulha tem mais a ver com a temperatura de serviço e com a qualidade do vidro/cristal que com a fineza do
espumante em si.
Enfim, dê sua opinião. Mas na dúvida é melhor jogar fora todos os
Champagnes que tem na adega e começar a tomar Lambrusco. Em taça flute,
obviamente.