Somente desta vez vou convidar vocês a levar a taça à orelha ao invés do nariz. Ouviu nada? Estranho, pois o vosso vinho está cheio de micróbios fazendo bagunça. Uns são bem-vindos para um precioso trabalho, outros são responsáveis pelos piores cheiros já sentidos e umas vezes são visíveis a olho nu. Para saber mais sobre eles o MondoVinho apresenta o “Top Ten dos micróbios na sua taça”.
Vamos lá.
Saccharomyces cerevisiae – no degrau mais alto do pódio, ele, é o mago da fermentação. Graças a este pequeno fungo incansável o pão fermenta e o mosto se torna Chianti. Guloso como ninguém, passa o tempo comendo açucares e...hem, transformá-los em álcool (bom...vocês entenderam). O Saccharomyces (literalmente: fungo do açúcar) vive de preferência nas peles das uvas, mas é usado também na fermentação da cerveja. Morre, geralmente, quando o vinho atinge os 16-17 graus alcoólicos. Se o suco tiver um teor de açúcar superior, o vinho será doce o suficiente para ser vinho de sobremesa.
Oenococcus oeni – é o responsável pela fermentação malolática, aquela que transforma o ácido málico presente no vinho no mais amanteigado ácido lático. Sabem aqueles aromas de manteiga do chardonnay? Tudo mérito dele. Ele amacia e tira as asperezas, sobretudo das uvas criadas em climas frios, que maturam com dificuldade.
Lactobacillus – praticamente é aquele presente no iogurte e no seu intestino. Se a sua garrafa apresenta alguns simpáticos filamentos em suspensão, melhor deixar pra lá: ele está ai. É o parente malvado do Oeni (mesma família de bactérias láticos), capaz de transformar em 48 oras um ótimo vinho em um ótimo vinagre. Um dos seus parentes próximos, o Hilgardii Lactobacillus, é responsavel pelo aroma de “rato morto” que aflige umas preciosas garrafas de tinto.
Schizosaccharomyces pombe – descoberto pela primeira vez em África, nas cervejas de milho (em idioma swahili pombe significa cerveja), é uma espécie de levedura bastante potente, pois é capaz de uma intensa fermentação alcoólica.
Brettanomyces – protagonista de ferozes debates entre apaixonados, você o reconhece logo pelo cheirinho de suor de cavalo, que nos casos mais sortudos vai para cheiros de couro. De origem e hábitos desconhecidos, vive um pouco onde quiser, preferindo as barricas de certa idade e as bombas usadas na adega. Alem do suor de cavalo, são conhecidas pelo menos mais uma dezena de fedorzinhos produzidos por este fungo, como de fármacos, plástica, borracha, queimado e outros.
Pediococcus – o do cheiro de “meia suija”. Os seus efeitos no vinho incluem também uma desagradável sensação amanteigada e uma pesada viscosidade do liquido. É usado para a fermentação dos chucrutes, e isso já diz tudo.
Acetobacter – já o nome não deixa imaginar nada de bom. Quando ele tiver presente, o seu vinho se transforma em ácido acético, aquele líquido bom somente para temperar a salada. Sabem quando os experts falam em “volatilidade alta”? Pois bem, estão falando da nossa bactéria que, porém não se expressou ao melhor das suas possibilidades, por isso o vinho está passado, mas não completamente perdido. Entre os compostos que o Acetobacter é capaz de produzir, o acetaldeído, responsável por aquele cheiro desagradável de maça amassada de uns brancos passados do ponto. Diferentemente de outros, precisa de oxigênio para viver e se reproduzir, então é só guardar o vinho corretamente para evitar surpresas desagradáveis.
Hanseniaspora – é uma levedura que se forma nas cascas em mínima quantidade e com pouca capacidade de fermentação. Parece ser entre os responsáveis pelos primeiros estágios de transformação de açúcar, mas morre quase imediatamente por causa do álcool, coitadinho.
Botrytis Cinerea – fungo tanto feio quanto delicioso em seus efeitos, conhecido também como podridão cinzenta. Em uns casos é até desejado nas vinhas: na presença de umidade, ataca os bagos concentrando o açúcar até as uvas passificar tornando o suco doce e licoroso. Por um capricho da natureza o que era pra estragar se torna em uns dos mais deliciosos e caros vinhos do mundo como Sauternes, Tokaji e Trockenbeerenauslese. Por isso se fala de “podridão nobre”.
Levedura Flor – singular família de leveduras presentes em certos tipos de xerez espanhol. Eles se apóiam como uma película sobre a superfície e protegem o vinho da excessiva exposição ao oxigênio. Muitos destes microorganismos são filtrados durante o processo de engarrafamento, mas muitos produtores evitam filtragem drásticas, que fatalmente acabam diminuindo o corpo do vinho. Em qualquer caso, desconfie das rolhas que estouram ao abrir: se não for champanhe, o seu vinho está perdido para sempre.
Muito bem Professor.
ResponderExcluirGostei e aprendi muito com este post. Legal mesmo explica muito bem como funciona a viagem do suco de uva ao vinho.
Um abraço alemdovinho
Muito obrigado, Peter!
ResponderExcluirMas nada de Professorado, é um simples e humilde aprofundamento do assunto enológico.
Obrigado por visitar e comentar.
Grande abraço!