segunda-feira, 25 de julho de 2016

Vertical Biondi-Santi (e mais alguns crimes contra a humanidade enológica...)!


Falar em Brunello di Montalcino é de fato falar em Biondi-Santi: as duas coisas são imprescindíveis e indivisíveis, pois a história deste prestigiado vinho italiano se funde com a história da vinícola. 

Já em 1867 o vinho produzido pelo fundador Clemente ganhou Menção de Honra na Exposição Universal de Paris, reconhecimento enologicamente extraordinário, porque na época os franceses se consideravam os únicos produtores no mundo de vinho de qualidade. Mas de fato a invenção do Brunello é atribuída a seu filho Ferruccio Biondi-Santi, em 1888.

A denominação Brunello di Montalcino seja hoje talvez a mais badalada da Itália, tendo sido inclusive o primeiro vinho a ganhar a designação de DOCG (em 1980). E junto com Barolo certamente representa a tipologia de vinho italiano mais apto a envelhecer, dotado do enorme longevidade (podendo chegar saudavelmente até 40 anos de vida).

Hoje as empresas vinícolas produtoras de Brunello são mais de 200, cada um no seu estilo, mas a Biondi-Santi continua mantendo mais tipicidade e tradição, sendo considerada a jóia da coroa da região. Seus Brunellos merecem ser provados pelo menos uma vez na vida.

Graças ao bom Papai do Céu eu tenho provado estes rótulos até com certa freqüência (embora baixa), mas recentemente nos demos um presente bem mais raro: uma vertical de 4 safras, mais um Rosso (de bônus).

Vale lembrar que a propriedade “Tenuta il Greppo” conta com apenas 20 hectares dedicados para  Brunello, cerca de 60mil garrafas por ano, todas numeradas, mais umas 10mil para a Riserva.
Os Brunellos estagiam por 36 meses em toneis de carvalho de Eslavónia (região da Croácia, a não ser confundida com Eslovénia, o país) e mais 24 meses em garrafa. Eles têm longevidade variável de 20 a 40 anos, dependendo da safra e do armazenamento. Já os Rossos, estagiam por 12 meses no mesmo carvalho, mas procedem dos vinhedos mais jovens da propriedade e são para pronto consumo.

A nossa seqüência foi a seguinte:

Biondi-Santi Rosso di Montalcino 2013
Biondi-Santi Brunello di Montalcino Annata 2004
Biondi-Santi Brunello di Montalcino Annata 2007
Biondi-Santi Brunello di Montalcino Annata 2008
Biondi-Santi Brunello di Montalcino Annata 2009


Uma ressalva importante: o produtor se declara fortemente contrário ao uso de decanter e recomenda abrir as garrafas 8 horas antes da degustação. Obviamente não fizemos nada disso: como marcamos num restaurante a logística se tornaria complicada. Portanto, mesmo contrariando o produtor, abrimos praticamente na hora, jogamos poucos minutos no decanter e bebemos em seguida. Era um dia de “maldade” haha.

Quem acompanha o blog sabe que por aqui costumamos cometer crimes como infanticídio, violência, extermínio de massa, e outras atrocidades do gênero contra os amados vinhos, então imagine se a gente ia deixar de apreciar esta vertical mesmo não tendo as condições ideais!

Mas de fato, devo reconhecer, os vinhos mereciam ser esperados mais um pouco e, sobretudo, aerados mais longamente; portanto não repita isto em casa! Aliás, se você tiver um Brunello Biondi-Santi de safra 2004 na adega a dica é a seguinte: abra apenas em 2044 e deixe respirar por 8 horas, ok? Depois não diga que não avisei.

Brincadeiras a parte, mesmo com todas as contra-indicações do caso, nos divertimos bastante. Afinal, sobre o vinho eu digo sempre: melhor 3 anos antes que 3 meses depois.

Os vinhos, inútil dizer, foram todos extraordinários, com aquele perfume inconfundível de Sangiovese e aquela acidez vibrante típica de seus vinhos. Todos de textura aveludada, grande profundidade, taninos finos e abundantes, muito equilíbrio e final de longuíssima persistência.

Sem entrar em muitos detalhes: o 04 foi o grande ganhador da noite, finíssimo e saboroso; o 07 foi o mais pronto dos 4, com mais corpo e a fruta em destaque; já o 08 lembrou o 04 com mais austeridade e o 09 ficou em último lugar apenas pela extrema juventude. 
Mas se trata de nuances, pequenas diferenças entre uma safra e outra, mas que confirmam a consistência e o elevado nível destes fantásticos vinhos que fazem jus ao nome que levam.










domingo, 3 de julho de 2016

Visitando Almaviva

Chovia muito sobre Santiago, com temperatura por volta dos 5 graus e um vento frio, que junto com a umidade do ar levava a sensação térmica perto de zero. Definitivamente não o melhor dia para visita á vinícolas. Mas isto faz parte, e afinal estava me esperando não uma vinícola qualquer e sim uma das mais badaladas da America Latina: a Almaviva. Então armado de um bom casaco e um bom guarda-chuva sai para esta nova aventura.

A vinícola fica nos arredores da cidade, em direção sul, Puente Alto. Por lá ficam localizadas outras vinícolas ícones como a Vinhedo Chadwick (praticamente ao lado) e a própria Concha Y Toro. Dá para chegar de taxi ou de ônibus. A primeira opção pode sair um pouco cara (são cerca de 30 km do centro de Santiago) e a segunda pode ser arriscada se não conhecer o ponto de descida. No meu caso, na dúvida também pelo trânsito parado por causa da chuva, optei por um meio termo: metro + taxi. Desci na Plaza de Puente Alto, ponto final da linha 4 (pode ser na estação Las Mercedes também) e de lá peguei um taxi para mais uns 6-7km finais até a vinícola. Ficou rápido, prático e econômico.  
Cheguei assim á vinícola no horário marcado, aonde a simpática e competente señorita Christel me conduziu numa interessante visita pelas instalações da propriedade.



Devido às condições climáticas adversas decidimos pular o passeio nos vinhedos e fomos direto ao assunto.

O vinhedo

Vinhedo de Cabernet Sauvignon, visto do 1o andar da propriedade


Para quem ainda não sabe a vinícola é fruto de uma joint-venture entre uma das mais badaladas vinícolas do Velho Mundo, o Chateau Mouton-Rothschild, e uma das mais badaladas do Novo Mundo, a Concha Y Toro. A pareceria entre as duas partes foi assinada em 1997, com o intuito de criar um vinho chileno nível Premier Grand Cru Classé de Bordeaux.

No Chile não existe uma classificação oficial de vinhos, mas mesmo assim o Almaviva foi o primeiro vinho chileno classificado como “Primer Orden”, para trazer em espanhol o conceito de premier cru. Para isto o vinho tem que ser produzido a partir de um único vinhedo, numa única vinícola e ter sua própria equipe, sendo as 3 coisas dedicadas exclusivamente para a produção de um único vinho.
O nome Almaviva vem da literatura francesa: o Conde de Almaviva é o herói da peça teatral Le Mariage de Figaro (As bodas de Figaro, em português), que depois se tornou também uma ópera do Mozart. Já o logo da casa homenageia a história ancestral do Chile reproduzindo o símbolo da Terra e do Universo na visão Mapuche. O desenho aparece no “kultrun”, um instrumento de percussão usado nos rituais deste povo indígena.

O kultrun

Os 85 hectares de vinhedo são plantados em sua maior parte com cabernet sauvignon, e com pequenas parcelas de merlot, cabernet franc, carmenere e petit verdot. Solo pedregoso e calcário, irrigação feita por um engenhoso sistema de gotejamento subterrâneo.
A colheita é rigorosamente manual e as uvas são previamente selecionadas também manualmente e depois numa triagem mais restrita através de um leitor óptico. Por gravidade o mosto vai para os toneis de aço onde fermentam em temperatura controlada e finalmente para o descanso final em barricas de carvalho novas.

A sala das barricas


No final da visita numa linda salinha de jantar nos esperava uma garrafa do Almaviva 2009 para degustação. O blend desta safra foi o seguinte: 73% Cabernet Sauvignon, 22% Carmenere, 4% Cabernet Franc, 1% Merlot, com estágio de 16 meses em barricas de carvalho francês novas.
O vinho surpreendeu pela fruta em grande destaque mesmo depois de 7 anos: cassis, cereja, morango com notas de tabaco, café e baunilha. As mesmas sensações repetidas em camadas numa boca encorpada, elegante e de textura aveludada. Super-equilíbrio entre acidez, álcool e taninos maduros, com a madeira bem integrada, para um final de longa persistência.

Salinha de prova



Na taça: Almaviva 2009

A visita foi muito boa, tudo lembrou muito o esmero e o primor dos grandes chateaux de Bordeaux. Muito obrigado a Almaviva e sua equipe pela disponibilidade e cortesia.

Confira mais fotos a seguir

Borras

Dois personagens da mitologia :-)

Processo de engarrafamento e embalagem

O laboratório para as analises quimicas